Especialistas destacam que patrões irão para cima do controle social dos acidentes e doenças de trabalho que hoje atingem quase cinco milhões de pessoas
Um minuto de silêncio aos 16 trabalhadores mortos, aos desaparecidos e às vítimas de acidente de trabalho do desastre ambiental em Mariana causado pelo rompimento de barragem da mineradora Samarco, em Minas Gerais, em novembro do ano passado. Foi assim que começou o seminário Vítima Silenciosas do Trabalho – Não ao Golpe realizado nesta quinta-feira (28), no centro da capital paulista.
A atividade, organizada pela CUT São Paulo, contou com ampla participação de sindicatos, trabalhadores da saúde e interessados no tema e demonstrou durante o debate, por meio de depoimentos de pessoas adoecidas em função da atividade profissional, que ainda falta muito para que o Brasil tenha condições dignas nas atividades profissionais.
Secretário de Saúde do Trabalhador da CUT São Paulo, Wagner Menezes, falou sobre o desafio de manter os direitos fundamentais da classe trabalhadora neste novo cenário de flexibilização do mundo do trabalho. “Temos que fazer toda luta possível para que a saúde não caia nas mãos do empresariado. Os poderosos são contra o SUS (Sistema Único de Saúde) e o nosso papel, ao contrário, é ele seja fortalecido, assim como os direitos trabalhistas”, disse, ao criticar, em seguida, a falta de cooperação na saúde do governo de São Paulo com outras instâncias públicas de poder.
Num momento em que o Brasil vive investidas contra a democracia e a presidenta da República, Dilma Rousseff, o secretário municipal da Saúde de São Paulo, Alexandre Padilha, avaliou os riscos para a população. “Se o golpe tiver um desfecho, teremos que ter acumulado muita força para resistir e defender o SUS, já que não há compromisso algum de empresários, setores do Judiciário e da grande imprensa.”
Padilha também alertou sobre os riscos do plano do vice-presidente da República, Michel Temer (PMDB), chamado “Uma ponte para o futuro”. “Eles (golpistas) querem desvincular ainda mais os recursos da saúde. Hoje enquanto a cidade de São Paulo já aplica 20% na saúde, o governo de São Paulo investe apenas 12%”, afirmou, referindo-se ao percentual mínimo (12%) exigido por lei do orçamento em ações e serviços de saúde pública.
O secretário de Saúde do Trabalhador do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região, Dionísio Siqueira, reforçou a importância das entidades sindicais na atual conjuntura.
“O povo está muito distante do conhecimento sobre os direitos que têm. Os pensadores, a nossa vanguarda que construiu a Constituição, tem que ampliar o acesso às informações. Nossos sindicatos têm o papel de exigir direitos, de promover o controle social e fazer com que as normas sejam aplicadas. A principal tarefa é empoderar cada vez mais os trabalhadores”, avaliou.
Controle social
Dados recentes e inéditos, contidos na Pesquisa Nacional de Saúde, do IBGE, mostram que quase cinco milhões de trabalhadores (4,948 milhões) se acidentaram no Brasil em um ano, entre 2012 e 2013.
O número difere da estatística oficial apresentada até então no país. Apesar de obrigatórios, os registros de acidentes são subdimensionados, como ressaltaram os palestrantes.
Médica pesquisadora da Fundacentro, Maria Maeno, mostrou que mesmo depois de anos de sistemas informatizados, ainda não se sabe quantos são os acidentes de trabalho no Brasil, a não ser pelos dados da Previdência, ainda insuficientes, segundo ela. “Não sabemos a totalidade das doenças e dos acidentes relacionados ao trabalho. As empresas acidentam, matam e adoecem, mas o Estado brasileiro não coloca isso pra sociedade. Não se sabe quantos acidentes existem em cada empresa, não se mostra o CNPJ do empresariado”.
Para ela, as políticas de prevenção de acidente de trabalho não podem se restringir à compra de máquinas mais avançadas. Ela defende que além de se discutir questões técnicas é preciso debater como o trabalho é organizado e como a produtividade é medida.
A advogada Maria Leonor Jakobsen, afirmou que apesar de o ambiente ter mudado em alguns locais de trabalho, a exploração permanece. “Temos democracia nos locais de trabalho? Não conseguimos isso nos últimos 30 anos. A saúde é um direito de todos, mas mesmo os direitos mínimos de cidadania são recusados a muitos trabalhadores”, pontuou.
Maria Maeno também lembrou que as empresas, hoje, informam oficialmente quais são os fatores de risco a que estão submetidos os trabalhadores, mas não são os trabalhadores que apontam isso, ou seja, são os empresários que respondem. “Quais empresas declararão que submetem seus trabalhadores a condições inadequadas de trabalho?”, questionou, ao reforçar a necessidade do controle social.
Ao lado do advogado Antônio Rebouças, que defendeu a necessidade de o movimento social tomar as ruas contra possíveis retrocessos na área da saúde brasileira, o coordenador da Secretaria de Saúde do Trabalhador da cidade de São Paulo, Ricardo Menezes, destacou que o futuro brasileiro depende da luta dos movimentos sociais. “A classe dominante brasileira sempre foi selvagem na exploração da mão de obra do Brasil e, por isso, temos que lutar contra o golpe que representa o retrocesso de direitos aos trabalhadores.”