Organização das mulheres, nos movimentos sindicais e sociais, teve importância fundamental para que país não sofresse retrocessos ainda maiores na luta por direitos iguais e fim da violência de gênero, concluem organizadoras do evento
O movimento sindical bancário se destaca pela vanguarda na luta por igualdade de gênero nas mesas de negociação, e um balanço dessa trajetória foi realizado durante o seminário “Basta! Não irão nos calar! – caminhos para um novo Brasil, sem violência contra a mulher”, realizado pela Secretaria da Mulher, da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT), na última quarta-feira (22).
“A primeira vez que levamos o debate sobre a licença parental na mesa de negociação, os bancos riram. Tivemos que explicar o que era esse direito e mostrar que já acontecia em outros países, onde a discussão sobre compartilhamento das atividades domésticas entre homens e mulheres, incluindo o cuidado com os filhos, estava avançada”, lembrou a presidenta da Contraf-CUT e vice-presidenta da CUT Nacional, Juvandia Moreira.
A licença-paternidade de 20 dias foi uma conquista da Campanha Nacional de 2016. Alguns anos antes, em 2000, as bancárias conquistaram a inclusão do temaigualdade de oportunidade nas mesas de negociação. Em 2010, foi a vez de a categoria obter na Convenção Coletiva de Trabalho (CCT) a inclusão da cláusula de combate ao assédio moral. Em 2020, a categoria conquistou um aditivo à CCT que dá as diretrizes para a criação de um programa de prevenção à prática de violência doméstica e familiar contra bancárias, incluindo a criação de canais de acolhimento, orientação e auxílio às vítimas. E, finalmente, no ano passado, a cláusula de combate ao assédio sexual.
“Essas conquistas têm relação com o aumento de mulheres no movimento sindical”, avaliou a presidenta do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região (Seeb-SP), Ivone Silva. Durante sua participação no seminário, ela fez um breve histórico do avanço da representatividade feminina no sindicalismo bancário, passando pela campanha de sindicalização no final da década de 1990, com o mote “Nunca Desista”, a criação de cartilhas sobre igualdade de oportunidade, combate e prevenção de assédio sexual, até chegar na elaboração de relatórios pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) sobre as diferenças salariais entre homens e mulheres.
“Foi em 2001 que apresentamos pela primeira vez, na mesa de negociação, um relatório provando a discriminação salarial por raça e gênero, mostrando para a Fenaban que estávamos certos no nosso discurso sobre a necessidade de haver igualdade de oportunidade dentro do banco”, lembrou Ivone.
Apesar do saldo positivo, as palestrantes concordaram que ainda é preciso percorrer um longo caminho para superar a desigualdade de gênero no país e no setor financeiro. Um estudo mais recente produzido pelo Dieese e apresentado neste mês de março mostrou que no mercado de trabalho as mulheres ganham, em média, 21% menos que os homens. “Na categoria bancária, a desigualdade é um pouco mais aprofundada: a remuneração das mulheres é 22,2% menor que a média dos colegas homens. Além disso, quando verificamos que a remuneração da mulher negra é, em média, 40,6% inferior à remuneração do homem bancário branco”, destacou Juvandia.
Empenho das bancárias pela ratificação da C190
Na avaliação da secretária-geral do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Neiva Ribeiro, que também palestrou no encontro, o processo de formação e capacitação de mulheres, sobre os seus direitos, e dos homens, sobre as suas responsabilidades, teve e ainda tem papel importante para “romper com as barreiras estruturais que emperram o combate” à violência de gênero.
Neiva destacou como exemplo positivo do processo de formação, promovido pelo movimento sindical, o avanço recente para a ratificação da Convenção 190 (C190), da Organização Internacional do Trabalho (OIT), sobre eliminação da violência e do assédio no ambiente laboral. Além de fornecer uma definição internacional de violência e assédio no trabalho, incluindo a questão de gênero, a C190 estabelece linhas de atuação para o combate às várias formas de violência no trabalho.
No dia 8 de março, o presidente Lula oficializou o envio ao Legislativo de proposta para que o Brasil ratifique a convenção. “Agora, dependemos de votação na Câmara e no Senado para que a C190 seja ratificada. Então, nossa tarefa agora é pressionar o Congresso”, completou Neiva.
Retomada de políticas públicas
O protagonismo das bancárias para avançar no combate à desigualdade de gênero foi destacado também na fala da Secretária Nacional de Enfrentamento à Violência contra a Mulher, do Governo Federal, Denise Motta Dau, que participou do seminário. Ela reconheceu, em especial, a iniciativa “Basta! Não irão nos calar!”, criada pelo movimento sindical para oferecer atendimento jurídico a mulheres em situação de violência doméstica e familiar e que, neste ano, será ampliado em mais dois canais, completando 12 no total.
“Quando vocês chamam a atenção para o problema da violência e desigualdade de gênero, tornando uma pauta nacional de negociação com a Fenaban, vocês fazem história”, avaliou Denise. No âmbito das políticas públicas exercidas pelo Estado brasileiro, ela pontuou que ocorreram sérios retrocessos nos últimos anos, como o desaparecimento do Ministério da Mulher, recriado agora no terceiro mandato do presidente Lula, e queda drástica no orçamento para o enfrentamento à violência de gênero.
Um levantamento do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), mostra, por exemplo, que o governo Bolsonaro cortou 94% da verba destinada para a proteção das mulheres, nos orçamentos elaborados e enviado ao Congresso, referentes aos anos 2020 a 2023.
Denise destacou que o atual governo federal apresentou, em 8 de março, Dia Internacional da Mulher, um pacote de medidas que abrangem mercado de trabalho, assistência social e segurança de vítimas de violência, com objetivo de reverter a quadro da desigualdade de gênero.
A Secretária da Mulher da Contraf-CUT, Fernanda Lopes, pontuou durante o evento que a organização das mulheres, nos movimentos sindicais e sociais, teve importância fundamental nos últimos anos. “Essa atuação na resistência foi o que permitiu que não vivenciássemos nesse período retrocessos ainda maiores na luta por direitos iguais e fim da violência de gênero”, refletiu.
Fonte: Contraf-Cut